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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Que cultura é esta?

Será que vamos continuar assistindo Camaçari como sendo uma cidade provinciana até quando? Pois é minhas correntes, acordei hoje meio nostálgico e indignado com este descaso ao qual a cultura de nossa cidade vem sendo submetida. Recordando-me dos tempos de festivais de monólogos e festivais pluriculturais que aconteciam no antigo Teatro Magalhães Neto, no final da década de 1990, bem como pelas ruas da cidade e em outras localidades do estado da Bahia, ponho-me a escrever. Quem viveu a época sabe do que estou falando! Até um festival de música já aconteceu em Camaçari, é inacreditável! Mas, se com tão pouco conseguíamos fazer com que os eventos acontecessem na cidade, porque hoje é tão complicado, se somos nós os atuais “gestores” da cidade? No entanto, percebo que a comunidade artística da cidade está se mobilizando e dando uma resposta, ou quem sabe assumindo uma dívida cultural que a gestão municipal tem para com os seus munícipes.
Bom, nem só de recordações viverá o homem, estou falando é do presente, mas como falar do presente sem o passado por perto? Ver músicos tocando em barzinhos da cidade, grupos de teatro lutando pela sobrevivência, poetas com seus escritos engavetados, a cultura popular sendo empurrada com a barriga, sobrevivendo de migalhas que caem da mesa aqui e ali, a exemplo do Boi de Parafuso, do Mandu de Monte Gordo, do Espermacete de Barra do Pojuca, da Chegança de Arembepe, enfim, quantos artistas em nossa terra, não!? Será que santo de casa não vai fazer milagre nesta terra onde derrama leite e mel? Estou mencionado alguns artistas pelo “simples fato” de não termos a semana de cultura mais uma vez em nossa cidade. Será que é muito caro realizar uma semana de cultura com os artistas da terra? Não precisa importar artistas “globais”, pois estes sim cobrarão muito caro, e também não precisamos disso, temos o suficiente para realizar uma feijoada cultural com ingredientes plantados e cultivados no quintal da nossa própria casa.
Posso citar exemplos de festivais que dão valor a prata da casa. O Festival de Laranjeiras é um exemplo vivo, pois vai à sua 35ª edição e que coisa linda, vale à pena conferir. É uma cultura que foi construída de baixo para cima e não de modo inverso. Almejo algo nesse quilate em nossa cidade, pois temos mais que o suficiente para desenvolver um festival de cultura popular em Camaçari, e que vai deixar a metrópole boqueaberta. Temos artistas e grupos artísticos aos borbotões, só falta segundo Paulo Costa Lima, ex-presidente da Fundação Cultural Gregório de Matos de Salvador-BA, “proporcionar palcos para que essas manifestações artísticas emerjam”, e aclamem o potencial da nossa cidade.
Ah, não me venha com esse lenga-lenga de que a SECULT está sem dinheiro para realizar o evento, porque não cola mais. Adoro Chico Buarque quando diz, “hoje você é quem manda falou, tá falado não tem discussão, não”, e que democracia é essa que a gente tem que continuar aceitando o “não” da gestão atual? Já não estamos na repressão política que tínhamos que andar segundo Chico, “falando de lado e olhando pro chão”, chegou à hora de gritar. Como já dizia o nosso querido Gonzaguinha, “Quando eu soltar a minha voz por favor entenda”; e tenho certeza que já está acontecendo com, finalmente, a implantação do conselho Municipal de Cultura, mas que ainda se faz lento, enquanto isso a comunidade artística e a população continuam sedentas e famintas de cultura, salvo algumas doações por parte do Restaurante e Churrascaria Casa de Taipa, que está realizando um trabalho excelente na cidade.
Minhas correntes, lembro-me de quando a gente se juntava para filosofar, falar de cultura, literatura, artes e tocar qualquer instrumento em casa de Caio, na frente da casa de meu pai, (com direito a polícia, por conta dos vizinhos incomodados com o som alto), mas, ainda assim, surgiu daquela pequena manifestação, cabeças que acreditam em uma Camaçari melhor.
Um dia desses, presenciei uma cena belíssima no Restaurante Casa de Taipa, quando o norte americano, James Armistrong, da Penssilvânia, em visita a Camaçari para um workshop na cidade do Saber, tocou em Jam com músicos consideráveis em Camaçari, como Neive – bateria, Nego D’água – percussão, JR – baixo, Jai Dias – guitarra, dentre outros artistas da Cidade, que além de abrilhantar o evento, mostraram que santo de casa faz sim milagre.
Claro que a cidade não está totalmente inerte, pois tem o Padim vô na figura de Enoque Norberto, grande articulador de cultura popular, fazendo o seu trabalho de inclusão social aos jovens adolescentes, como se pode conferir na figura do mais novo cantor intérprete de Camaçari, Alan Brandão, o qual foi aluno do mestre Enoque, que é o autor do hino municipal de Camaçari, (mas, não tem o seu devido reconhecimento, diga-se de passagem); grupos de capoeira que resistem aos trancos e barrancos, na figura de meu amigo e companheiro Caio; e outros mestres de capoeira da cidade, bem como outros grupos, artistas e manifestações culturais sobreviventes na cidade. Enfim, o que precisamos é mostrar que somos capazes de fazer a diferença em nossa terra.
A guisa de conclusão, minhas correntes, o espaço que a gente buscava chegou, então como disse o Geraldo Vandré em plena repressão política, “vem vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora e não espera acontecer”, vamos minhas correntes, pois nas palavras de Gonzaguinha e homenageando o meu amigo e companheiro Caio, “eu acredito é na rapaziada que segue em frente e segura o rojão”. É hora de nós fazermos algo e mostrar que somos cabeças que pensam e agem, (desordeiros do pensamento), não somente, ficar sentado à mesa de boteco, jogando conversa fora e ficando só o bocal.

Joélio Santos é compositor, arranjador, instrumentista (Clarinete, saxofone e flauta-doce), arte-educador, produtor cultural, professor de música e escritor/poeta. Desenvolve pesquisa no mestrado em composição musical da UFBA. Em 2008, recebeu Menção Honrosa no II Concurso de Composição Ernst Widmer, com a obra “Cirandeiriação com Jaco”, para Duo de Piano e Violão. Em 2009, recebeu o prêmio FUNARTE/XVIII Bienal categoria orquestra, do júri da XVIII Bienal de Música Brasileira Contemporânea, no Rio de Janeiro, com a obra “Casa..., magia..., palhaço enfeitiçado”, para orquestra sinfônica. Atualmente estuda, compõe e desenvolve atividades, como professor de música, na cidade de Camaçari-BA.
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